TESTEMUNHOS

Cinco vozes em discurso directo

Por Carlos Machado e Moura e Paula Melâneo

Arquitecto e doutorando (FAUP); Arquitecta e Editor

 

Ilustração de André Silva
S/ título (da série Apanha-me se puderes), 2018
grafite s/ papel de bristol 21x14,8cm
Ilustração de André Silva
S/ título (da série Apanha-me se puderes), 2018
grafite s/ papel de bristol 21x14,8cm

 

 

Não podia esta retrospectiva deixar de colocar em discurso directo os principais responsáveis pela instituição ao longo destas duas décadas. Na falta da primeira presidente do Conselho Directivo Nacional (CDN), Olga Quintanilha, falecida em 2005, interpelámos os quatro restantes presidentes — Helena Roseta, João Belo Rodeia, João Santa-Rita e José Manuel Pedreirinho — acerca dos momentos marcantes de cada mandato, do presente e das principais questões para o futuro próximo. A este conjunto juntámos a voz de Pedro Brandão, presidente da Associação dos Arquitectos Portugueses (AAP) entre 1993 e 1995 e um dos principais responsáveis pela transição de Associação de Direito Público para uma Ordem profissional com regulação da profissão. 

Estes cinco contributos são um apanhado de questões e problemas, algumas das diferentes perspectivas e agendas de cada mandato, e ainda a abrangência dos desafios que hoje se colocam. Ficamos com um breve relato do percurso que levou à constituição da Ordem dos Arquitectos (OA) (um processo longo que, recordemos, encontrou a oposição de vários arquitectos perante a conotação de Ordem com o antigo regime), à definição do seu primeiro Estatuto com a regulação do acesso e da actuação profissional. Ficamos também com testemunhos sobre o Direito à Arquitectura, a Política Nacional de Arquitetura e Paisagem ou a revisão estatutária e deparamo-nos ainda com várias perspectivas complementares sobre o contexto da arquitectura no nosso país e a acção da OA.

Neste panorama, são especialmente produtivas uma série de oscilações. Entre o entendimento da OA como organismo centrado nos interesses dos seus profissionais e como agente de defesa do interesse público da profissão. Entre a necessidade de abertura da profissão e da internacionalização dos profissionais e a progressiva desregulação do mercado de trabalho. Entre a mediatização da profissão e a percepção do papel do arquitecto pela sociedade (e pelos próprios profissionais). Entre a mobilização para revogação do Decreto 73/73, consagrando o Direito à Arquitectura como acto exclusivo dos arquitectos, e a sua abertura a um conjunto de outros profissionais ao abrigo de direitos adquiridos. Entre o entendimento da arquitectura como acto cultural ou de cidadania e a sua condição profissional e comercial num contexto de grande concorrência. Entre a defesa da qualidade da arquitectura e a constatação objectiva da destruição da paisagem portuguesa. Entre a promoção da realização de concursos e a experiência recente de encomenda pública por ajuste directo ou subordinada ao preço. Entre a regulação da admissão e as assimetrias na oferta formativa no Ensino Superior. Entre o grande desinvestimento no imobiliário e na obra pública durante o programa de ajustamento imposto pela troika e a actual financeirização do imobiliário alavancada pelo boom turístico. As oscilações sucedem-se e a leitura das entrevistas permitirá enunciar muitas outras, não faltando sequer o próprio J–A, no contexto da divulgação da arquitectura, entre a abertura a um novo formato e o regresso a uma publicação regular em papel.

Todas estas variantes, que marcam o plural e contraditório panorama da arquitectura no contexto democrático e globalizado em que vivemos e em dependência directa dos vários governos, ao longo dos últimos 20 anos, fazem da OA um organismo em constante necessidade de se reequacionar.

 

 


 

Pedro Brandão

Arquitecto, Professor (IST) *

Tendo sido um dos principais mentores da transformação da AAP em OA, que veio a acontecer  em 1998, quais terão sido os ganhos mais relevantes para a arquitectura e o exercício da profissão com esta transição?

A transformação da organização profissional dos arquitectos foi um processo de aproximações, conduzidas ao longo de mais de uma década, forjando uma coesão para que a profissão se dotasse dos atributos adequados às transformações emergentes: o número crescente de profissionais, a sua dispersão pelo território, o aumento das competências técnicas do Estado e dos municípios e a internacionalização da arquitectura como profissão. Na procura dos serviços de arquitectura, traduziam-se as novas exigências sociais, para resolver problemas reais. Tudo requeria um quadro institucional com novas capacidades — a Habitação Social, a salvaguarda do Património, o Planeamento, o Ambiente… Na formação, nas normas dos concursos de arquitectura, na Deontologia, na adaptação ao quadro internacional, a classe profissional precisava de instrumentos efectivos.

O caminho percorrido não foi fácil, pois a cada passo foi necessário realizar consensos afastando divisões, conseguir maior coesão e proximidade, dando visibilidade à AAP, com novos espaços e temas de intervenção, com interesse para o público (aprender a arquitectura como um “interesse público”). O estatuto da Ordem seria a síntese, a expressão daquilo que conseguimos. Nalguns aspectos, foi pouco. 

Uma tal “obra” não está nunca terminada. É apenas um começo e (infelizmente) há enganos de caminho, na selecção das estratégias ou das prioridades. Por isso, vale a pena fazer o balanço regularmente… Os ganhos mais relevantes, diria, serão os que faltam ainda. 

 

Como vê, na actualidade, o papel desempenhado pela OA perante a sociedade e os arquitectos?

Se perante a sociedade o papel da Ordem será visto como o organismo dos interesses profissionais, o ganho não será coisa muito relevante… Bom seria, se a sociedade visse já, no trabalho da arquitectura, as razões de um real interesse público. É, por isso, uma evidência que falta, no dia-a-dia. 

 

Quais serão os principais desafios da OA num futuro próximo?

A arquitectura não é um domínio auto-centrado (nem se adquirem por decreto os seus atributos). Tornar isto evidente, será sempre o desafio, em múltiplos campos de actividade profissional e associativa. 

Pessoalmente marcaram-me os anos em que, com um vasto grupo de colegas de muitas proveniências e convicções, se criou a oportunidade para um “salto de Estatuto”, que não aconteceu por decreto. Ponto em que fiz, do meu balanço do caminho percorrido, um problema de investigação: a base dos desafios será uma ética altero-centrada, de serviço? Com isso em mente, gostaria de apontar algumas reflexões:

A Regulação profissional – Em Portugal as experiências no sentido da auto-regulação dos arquitectos 1 foram sempre escassas e débeis. Constatámos que as tentativas de regulação da profissão de arquitecto em Portugal, até 1974, tinham visado um modelo de “protecção”, que nunca fora conseguido:

—do acesso à profissão, implicando a protecção do uso do título e a exigência da formação;

—do território exclusivo de actuação, isto é, a protecção de uma reserva legal, um mandato exclusivo de funções profissionais por si definidas;

—da protecção contra a concorrência entre membros da profissão através da fixação dos honorários e impedimento da publicidade;

—da reserva de uma disciplina interna de protecção mútua, nas relações recíprocas entre os membros e com os clientes, e com o Estado.

A prospectiva, no contexto da internacionalização – Com a Democracia, as tendências emergentes criadas pelos novos temas e a internacionalização da arquitectura traduziam novas necessidades gerais,  considerando menos o “proteccionismo” e mais o reconhecimento de um interesse público da profissão, alternativo ao paradigma elitista do “profissional/liberal/tradicional”. É assim que o problema actual da concorrência já não pode ser desligado dos novos temas do exercício internacional. A análise comparativa na Europa permitiu-nos, então, enquadrar uma prospectiva da profissão, nos dilemas de uma identidade profissional de interesse público.  

Linhas para uma prospectiva estratégica – Se hoje está posto em causa o paradigma auto-centrado, outros se acentuam por efeito dos fenómenos da globalização dos mercados da Arquitectura, como a mediatização da profissão e o starsystem. Assim, poderemos apontar linhas estratégicas no sentido de uma maior abertura e interactividade da profissão com o contexto social:

— A identidade profissional pode-se ampliar reavaliando novas interacções em função das novas relações interdisciplinares e inter-profissionais, dos temas ambientais, urbanos. Não teria vantagem social a redução do papel do arquitecto ao "estilista de fachadas", "designer da embalagem", conduzido por ópticas de rentabilidade na imagem;

— A regulação das novas relações, centrada nos destinatários da arquitectura: sem negociação entre os intervenientes envolvidos (e não apenas dos representantes do negócio imobiliário ou das instâncias político-burocráticas), os procedimentos normativos impedem a gestão centrada no interesse público;

— A formação do arquitecto deve combater o ensimesmamento: fornecendo instrumentos e criando capacidades para a interacção: a acção comunicativa e a estruturação de uma "economia profissional" nas relações a montante e a jusante do projecto são decisivas para uma “subida na escala de valor real”. Um "projecto" não limitado à expertise da formalidade, excludente, isolada da vida.

— Hoje, tanto assistimos à revalorização de interesses públicos no plano do social e do ambiental — o património, arquitectura inclusiva, conservação de energia, protecção da paisagem, inclusividade social… como a uma desvalorização da doutrina profissional (substituída por normativas de reprodução de desigualdades).

 

Aplicações no contexto das mutações urbanas – Os fenómenos de mutação profissional acompanham as mutações na lógica de produção do espaço. A percepção de uma inadequação (ou imperfeição) dos estatutos profissionais do arquitecto pode ser denotada por várias formas no que toca à confiança que a sociedade exprime sobre a real capacidade dos profissionais. 

No balanço das convergências e divergências de requisitos, ressalta a ideia de que a vantagem comparativa não está tanto nas competências da interdisciplinaridade do desenho quanto nas do “meta-desenho”: um maior treino na coordenação de diferentes disciplinas envolvidas não põe em causa a capacidade do arquitecto no plano conceptual da forma urbana mas reclama maiores capacidades de interacção colaborativa, não só no plano mais vasto das profissões do urbano, mas também no plano dos "saberes" do urbano e, principalmente, no saber viver dos "actores" da vida na cidade. 

No plano do urbano, o espaço do desenho é de vários profissionais (arquitectos, planeadores, paisagistas, designers, artistas…) mas o tipo de responsabilidades envolvidas aproximam os diferentes actores, os sistemas, os significados. Não é por acaso que se fala mais rapidamente de interdisciplinaridade na escala do projecto urbano do que no projecto de edificações: o protagonismo profissional do arquitecto poderá não ter à partida um estatuto de liderança garantido em todo o âmbito do seu trabalho, nem mesmo é consensual a ideia de que a ele caiba sempre, por “razão das coisas”, na sua “visão de conjunto” 2 . Será uma luta permanente e sem ganhador garantido.

Na natural dialéctica da Arquitectura, entre as “funções civilizacionais” e a “orientação para o mercado”, a procura de autonomia e legitimidade nas suas actividades profissionais torna-se parte da natural tendência das profissões para corresponder a uma procura, afirmando uma competência. Mas a obtenção, por via legal, de uma total legitimação profissional não estará demonstrada aos seus destinatários por uma “autonomia moral” da Arquitectura.

A consciência de que não é apenas a lógica legal que determina os domínios da responsabilidade na acção profissional — os significados (códigos) do desenho reflectem valores, tanto quanto traduzem interesses. Por isso, é na interacção entre os profissionais da arquitectura e os outros agentes da construção da cidade, nomeadamente os seus destinatários, os cidadãos, que residirá sempre o verdadeiro território da afirmação da profissão de arquitecto.

 

 


 

Helena Roseta

Arquitecta, Deputada AR, Presidente AML

Tendo assumido a presidência do CDN em dois mandatos consecutivos, entre 2002 e 2007, que momentos desses mandatos considera terem sido marcantes relativamente ao papel da OA perante a arquitectura e o exercício da profissão?

Creio que o mais importante terá sido a mobilização dos arquitectos, estudantes de arquitectura e milhares de cidadãos para a petição sobre o direito à arquitectura, que pretendia revogar o decreto 73/73, e para a iniciativa de cidadãos sobre o mesmo assunto, que alcançou mais de 35 000 assinaturas. Foi uma grande esperança para os arquitectos, acabou por só dar frutos com a legislação de 2009, mas infelizmente na actual legislatura andámos para trás. A democracia tem destas coisas: é um trabalho permanente e nunca está concluída.

 

Como vê, na actualidade, o papel desempenhado pela OA perante a sociedade e os arquitectos?

Gostaria de ver a OA mais empenhada nas questões cruciais dos direitos que ainda estão por resolver, em particular o direito à habitação, à cidade e a um habitat equilibrado e sustentável. A crise da habitação, a gentrificação de alguns centros urbanos e a desertificação do chamado “interior” são problemas gravíssimos para cuja solução é fundamental o saber e a prática dos arquitectos. Não me esqueço do desafio ainda tão premente do Nuno Teotónio Pereira — “habitação para o maior número”. 

 

Quais serão os principais desafios da OA num futuro próximo?

A geração mais jovem defronta-se com um enorme muro pela frente — falta de emprego e de habitação. E, no entanto, temos milhares de habitações devolutas em todo o país e mesmo nas maiores cidades. É preciso inventar coisas novas — modos de reabilitar, re-habitar, circular e gerir que sejam sustentáveis e acessíveis, em alternativa à financeirização do imobiliário ou ao seu abandono. Há demasiado desperdício na forma como se encaram a construção e a reabilitação urbana e demasiada inércia e burocracia na forma como tudo se planeia e decide. Precisamos de uma OA mais presente em tudo isto e de muito mais arquitectos na tomada de decisões e na promoção de uma cidadania solidária e responsável.

 

 


 

João Belo Rodeia

Arquitecto, Professor (UAL)

Tendo assumido a presidência do CDN em dois mandatos consecutivos, entre 2008 e 2013, que momentos desses mandatos considera terem sido marcantes relativamente ao papel da OA perante a arquitectura e o exercício da profissão?

Falar em causa própria, mesmo que a pretexto da minha passagem pela OA enquanto respectivo Presidente, cuja actividade, sublinhe-se, foi inseparável das excelentes equipas que me acompanharam e do generalizado empenho dos funcionários da OA, não é algo que de todo aprecie. Os relatórios dessa mesmo actividade, em particular da concretizada, foram apresentados nos locais e em tempo próprios, permanecendo como fiéis depositários do muito que foi realizado. E, na verdade, acredito preferível deixar o tempo, esse grande escultor, ajuizar este mesmo passado, delegando para outros consequentes balanços e apreciações.

Contudo, não tenho pejo em afirmar que, mais do que marcantes momentos, foram em si mesmos marcantes os nossos próprios mandatos para a vida associativa. Sem prejuízo de tantos quantos estiveram antes de nós, cuja herança sempre respeitámos e procurámos continuar (como sempre sucede ou deveria suceder nas instituições que se prezam), poucos terão sido os ciclos associativos tão concretizadores e reformadores como aquele que decorreu entre 2008 e 2013. 

Entre os muitos momentos especiais que, no seu conjunto, traduzem o intenso trabalho no contexto do Direito à Arquitectura e da dignificação da profissão de arquitecto, recordo, desde logo, a Lei 31/2009 e a consequente revogação do Decreto 73/73, ambição colectiva com mais de 35 anos, um passo muito importante para a consagração desse direito ao redefinir, reenquadrar e dignificar o papel do exercício profissional do arquitecto. 

Depois, a Resolução do Conselho de Ministros 45/2015 que aprovou a Política Nacional de Arquitetura e Paisagem, fruto do firme empenho da OA desde 2009 e, recorde-se, tema do 12.º Congresso, outro passo deveras importante para a consagração do Direito à Arquitectura por aí defender-se a promoção da qualidade da arquitectura e do ambiente construído, a que urge, aliás, dar continuidade. 

Depois, também, a Revisão Estatutária da OA, imposta pelo Governo da República e que foi levada a bom porto, procurando defender-se a respectiva matriz representativa e reguladora, e a sua especificidade profissional, a par do aperfeiçoamento da própria estrutura organizativa da Ordem com vista a melhor funcionamento e a maior proximidade com os seus associados. 

E, ainda, a Norma portuguesa de Serviços de Arquitectura e Arquitectura Paisagista na Construção, publicada em 2014 mas objecto de muito trabalho anterior, que visou o reconhecimento dos serviços do arquitecto e do arquitecto paisagista na melhoria do processo de intervenção e construção da paisagem, recordando-se que a OA foi o organismo gestor da comissão técnica então criada para o efeito.

Outros momentos especiais decorreram do trabalho internacional. Além da activa participação no Conselho de Arquitectos da Europa (CAE), fundamental no contexto das relações com a Comissão Europeia, ou na própria União Internacional de Arquitectos (UIA), onde a OA ganhou nova voz e presença, registo, muito em particular, o protagonismo da OA na refundação do Conselho Internacional dos Arquitectos de Língua Portuguesa (CIALP) enquanto plataforma institucional de encontro das Associações Profissionais de Países e Territórios de Língua Portuguesa, entregando-lhe firme protagonismo no seio das organizações transnacionais de arquitectos, designadamente na própria UIA. E, neste contexto, o apoio da OA na criação de muitas das Ordens Profissionais nestes mesmos países e territórios, destacando-se o caso do Conselho de Arquitectura e Urbanismo (CAU) do Brasil, com o qual viria a subscrever o histórico e inédito Acordo Bilateral que estabeleceu as condições de inscrição de arquitectos portugueses e brasileiros no CAU e na OA.

Por último, mas não menos importante, sublinho a própria reforma e reorganização internas da OA, sempre na perspectiva de uma instituição mais credível, mais capaz e mais próxima dos associados. Quase nada ficou igual. Desde a resolução do comodato da Sede Nacional até à decisão de construir a nova Sede da Secção Regional do Norte. Desde a nova infra-estrutura digital, incluindo o primeiro Centro de Dados digno desse nome, até à reforma da gestão financeira e respectivos instrumentos, passando pela primeira base de dados conjunta de todos os membros. Desde a nova marca institucional da OA até às inúmeras plataformas digitais, todas refundadas ou criadas de novo, incluindo o Portal dos Arquitectos, que permitiu serviços on-line aos associados, a que importa, aliás, dar continuidade. 

Quando olho para trás, espanta-me como tanto foi conseguido naquele espaço de tempo, mais ainda quando considerado o nosso segundo mandato em travessia pelo Rubicão, ou seja, em plena crise do país que, como sabemos, teve tremendo impacto na profissão e na própria OA. E, por isso mesmo e por último, recordo os dois Manifestos que a OA endereçou a todos os Partidos Políticos com assento parlamentar em 2009, em particular aquele a pretexto das eleições legislativas desse mesmo ano, documento estratégico que procurava antecipar um conjunto de medidas concretas para a melhoria do ambiente construído e do exercício profissional dos arquitectos, incluindo algumas que procuravam dissipar alguns dos efeitos da crise que então se adivinhava. Momento este também especial, desde logo por ser único, pois não teve posterior continuidade. E também marcante, pois, em si mesmo, espelhava em pleno a visão que tínhamos para o papel da OA diante da Arquitectura, do exercício da profissão de arquitecto e da sociedade portuguesa.

 

Como vê, na actualidade, o papel desempenhado pela OA perante a sociedade e os arquitectos?

A razão de ser da OA está plasmada no seu Estatuto, aprovado pela Assembleia da República, onde estão consagrados o âmbito e objectivos da sua actuação. 

Desde logo, a representação institucional e a dignidade desta representação, pois, na justa medida em que a OA reúne todos os arquitectos em Portugal, apenas a OA pode entregar voz conjunta a todos eles diante de terceiros, dentro e fora do país, pugnando tanto por melhores condições para o exercício da profissão quanto pela afirmação da arquitectura como um direito de todos e como incontornável na melhoria do ambiente construído, quanto ainda pela contínua indução da respectiva importância junto do grande público, muito em particular no contexto da melhoria da sua qualidade de vida.

Depois, mas não menos importante, a regulação profissional, sempre na perspectiva do interesse público, ou seja, de assegurar ao grande público que todos os inscritos na OA reúnem as condições indispensáveis para meritório e correcto exercício profissional, decorrendo daqui o acompanhamento próximo do ensino da arquitectura, o consequente estabelecimento de regras de admissão, a observação transversal e permanente do exercício dos actos profissionais e suas condições, bem como a necessidade de contínua formação. Além, como é óbvio, da OA funcionar como tribunal de primeira instância para dirimir problemas interpares ou de pares colocados por terceiros.

Ou seja, além da espuma dos dias, o papel desempenhado pela OA perante a sociedade e os arquitectos não muda. O que muda são as equipas que dirigem a Ordem em cada mandato e, a partir do âmbito e objectivos estatutários, os seus programa e objectivos políticos, o perfil de actuação e a pertinência na resposta aos contextos de cada tempo, bem como a pertinência da respectiva capacidade em antecipar o devir. 

Ora, a avaliação da actividade de cada equipa deve ser feita nos locais apropriados e ao longo e no final dos respectivos mandatos e, por razões que julgo óbvias, muito mal ficar-me-ia estabelecer juízos de valor neste momento e neste suporte sobre a actuação dos actuais órgãos sociais da OA.

 

Quais serão os principais desafios da OA num futuro próximo?

Além do afirmado anteriormente, existem desafios e projectos que considero urgentes em futuro próximo e no consequente devir. 

Desde logo, o reforço da afirmação da indispensabilidade da OA — o que é e para que serve — junto dos seus associados e dos candidatos a associados — particular atenção deve ser dada a esta questão no contexto formativo inscrito no processo de admissão — e da própria sociedade portuguesa, numa época muito difícil para todas as entidades reguladoras em face do actual ascendente de visões desreguladoras decorrentes do chamado neoliberalismo, tanto em Portugal quanto na União Europeia, que, diga-se de passagem, de liberal — no sentido da livre escolha — têm pouco e de novo ainda menos.

Depois, como sempre sucede, a procura de melhores condições para o exercício da profissão, sendo certo que, entre outros, alguns projectos parecem-me prioritários, muitos dos quais, aliás, ainda iniciados antes de 2013. Falo da reorganização e revisão clarificadoras da legislação no quadro de um Código de Edificação. Falo do estabelecimento de um Regime Remuneratório para os actos profissionais dos arquitectos tal como acontece, por exemplo, na Alemanha, por forma a pugnar pelo interesse público decorrente da qualidade da arquitectura e do ambiente construído. Falo da melhoria do Código dos Contratos Públicos no que toca aos actos profissionais dos arquitectos, que não podem continuar a ser equacionados apenas como mera prestação de serviços. E, em idêntico sentido, falo do concursamento do Estado que, na maioria das vezes, está mais sujeito a preços do que à pertinência da qualidade da arquitectura e da melhoria do ambiente construído.

Depois, também, a efectiva implementação da Política Nacional de Arquitetura e Paisagem, já referida, em programas e objectivos claros e transversais a partir da própria governação, com vista à melhoria do ambiente construído e da qualidade de vida dos cidadãos. 

Depois, ainda, a incontornável necessidade de repensar a actuação da OA no quadro da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior e no contexto lato do Ensino da Arquitectura em Portugal, e, assim sendo, o próprio regime de admissão à OA e/ou o regime de acesso aos actos do exercício profissional, tanto mais que, a meu ver, não só existe actualmente enorme disparidade nas condições e conteúdos do ensino da arquitectura entre as diferentes instituições que o ministram, resultando daqui evidente desigualdade de circunstâncias para os futuros candidatos à admissão à OA, quanto muitas dessas mesmas instituições de ensino, incluindo algumas das que mantêm protocolos de colaboração com a OA, incumprem actualmente o espírito e a letra das orientações internacionais a que a OA se obriga, designadamente as comunitárias, da UIA, do CAE e do CIALP. A OA não pode continuar a tratar de forma igual aquilo que é diferente e, sobretudo, deve acautelar a livre circulação comunitária dos seus associados e a sua própria obrigação estatutária no âmbito da regulação profissional e do interesse público que esta representa.

Ainda, por último, importa preparar a OA para o futuro, fazendo-a mais propositiva, tornando-a num player junto das organizações e plataformas internacionais ligadas ao exercício profissional onde está representada, ou dever-se-ia representar, melhorando o seu funcionamento e instalações (materiais e virtuais), disponibilizando mais e melhor informação profissional, cuidando da sua memória colectiva, aproximando-se dos associados e, sobretudo, reforçando os seus quadros, não só por forma a poder acompanhar a actuação do Estado, como, também, a antecipar essa mesma actuação, designadamente através de propostas políticas ou legislativas.

A pertinência da actuação da OA sempre decorre, em cada mandato, da gestação atempada de programas associativos credíveis e exequíveis; da coesão, qualidade e determinação das equipas eleitas; da sua capacidade concretizadora, da perspicácia estratégica e da convicção no diálogo estabelecido com o Governo e demais parceiros; e da optimização dos recursos disponíveis, incluindo os humanos. 

Contudo, volto a repetir, muita da actuação incorre da humildade em saber reconhecer e gerir a herança positiva daqueles que estiveram antes de nós, e em saber antecipar o devir, entregando legado positivo àqueles que virão depois de nós. Só assim poderá a OA afirmar-se como instituição e servir cada vez melhor os seus associados, a Arquitectura e a sociedade portuguesa.

 

 


 

João Santa-Rita

Arquitecto, Professor (UAL)

Tendo assumido a presidência do CDN entre 2014 e 2016, que momentos do seu mandato considera terem sido marcantes relativamente ao papel da OA perante a arquitectura e o exercício da profissão?

O mandato de 2014-2016 exerceu-se durante um período singular e difícil da vida de Portugal, que foi marcado pelos últimos anos da crise económica e financeira que atingiu profundamente os Portugueses e os Arquitectos. A referida crise sentiu-se de um modo particularmente acentuado na área da arquitectura, decorrente do forte desinvestimento ocorrido na promoção imobiliária e na realização de obras de carácter público.

Tendo em conta esses aspectos, no período em que assumi a Presidência do CDN, a atenção teve muito naturalmente de se dirigir, eventualmente mais até do que nunca, para os membros, para a sociedade e para as diversas instituições, quer nacionais quer estrangeiras, que a OA integra ou com as quais se relaciona. Era imperativo promover o encontro da instituição com os membros, centrar os esforços nos temas ligados à sua prática nos mais diversos aspectos e procurar restituir o ânimo e a esperança, através da construção de um novo modo de aproximação. 

Não posso deixar de salientar um facto decisivo para as muitas acções e iniciativas que ocorrerem durante o mandato, muito concretamente o empenho e coesão de todos os elementos do CDN, desde as suas qualidades individuais, às qualidades enquanto grupo, o trabalho e o suporte dos diferentes funcionários e o trabalho de apoio e aconselhamento dos juristas consultores da OA. 

Presidir a uma instituição como a OA é uma honra de uma dimensão dificilmente mensurável. Ficam muitas memórias, desde as iniciativas realizadas, às discussões pela noite dentro, aos confrontos ocorridos, aos contactos mantidos, às amizades construídas, aos quilómetros percorridos e, finalmente, aos laços estabelecidos um pouco por todo o mundo onde a OA se fez representar.  

Os momentos marcantes dizem muito naturalmente respeito a todos aqueles que, pela sua natureza, foram transversais ao mandato, alguns serão inclusive transversais à acção da OA, sendo matérias que dificilmente se dão por concluídas ou esgotadas e que se sucedem de mandato para mandato, exigindo a continua atenção e entrega das diversas direcções.

Posso referir, entre outros momentos, os que se prenderam com um conjunto de aspectos como sejam os seguintes: 

— Criar uma nova proximidade com os futuros arquitectos, através da celebração da Recepção aos Novos Membros (em parceria com as SR);

— Criar uma nova proximidade com os membros e com a sociedade através da realização do Roteiro pela Profissão, inclusive como um modo de construção do tema do Congresso;

— Manter a proximidade com os temas associativos, como seja o caso da revisão do Estatuto (iniciada no mandato 2011-2013), da elaboração/revisão dos diversos regulamentos e, ainda, de um tema fundamental como a continuidade da consolidação financeira da OA; 

— Manter a proximidade com os temas da profissão através das acções em torno da primeira revisão da Lei n.º 31/2009, da defesa da revisão e compilação de toda a legislação referente à edificação e construção, da defesa da publicação e implementação da Política Nacional da Arquitetura e Paisagem e, por último e em nada menos importante, na defesa pela implementação de um novo referencial em matéria de honorários;

— Manter a proximidade com a divulgação da Arquitectura Portuguesa, dando continuidade ao programa da exposição Habitar Portugal, lançando um novo formato do J—A e iniciando o processo da criação de um Manual da Internacionalização da Arquitectura Portuguesa;

— Reforçar a proximidade com as instituições e associações nacionais e internacionais. 

Sendo claro que nem tudo teve a mesma intensidade, destacaria, pela exaustão e empenho da OA no seu todo bem como de muitos dos seus membros, os muitos momentos ocorridos em torno da discussão da primeira revisão da Lei n.º 31/2009, nas representações parlamentares, nas comissões do Parlamento, junto dos dois últimos Governos e nas instituições internacionais, incluindo a Comissão Europeia. 

Estas inúmeras acções ilustram bem a dimensão da discussão da revisão da lei em causa e da abrangência da mesma. Não posso deixar de referir o comovente empenho e resposta dos membros aquando do lançamento, em 2014, da petição Pelo Direito à Arquitectura, que contou com a arquitecta Ana Bonifácio enquanto primeira subscritora, com a subscrição de anteriores presidentes e dirigentes da OA, bem como dos milhares de membros, tendo sido o contributo e participação de todos decisivo para o sucesso da referida Petição.

Destacaria ainda o momento da elaboração/revisão dos regulamentos da OA no decurso da aprovação do novo Estatuto, que contou com a contribuição, empenho e disponibilidade dos diversos órgãos da OA, num esforço de trabalho conjunto que em muito dignificou a instituição, permitindo uma discussão aberta, no sentido de alcançar consensos em torno das diversas matérias.

O Roteiro pela Profissão constituiu um momento muito particular da vida da OA, uma espécie de viagem pelo país, procurando levar os temas da OA aos que estão mais distantes. Foi uma motivante e emocionante iniciativa que contou com o contributo dos eleitos e dos funcionários, dos Núcleos e Delegações, realizando encontros em diversas regiões do país, de modo a promover a reflexão e discussão em torno de temas do interesse da Arquitectura, do exercício da profissão e da sociedade, abrindo o diálogo aos políticos, aos cidadãos e aos membros. 

Sem menosprezar qualquer iniciativa do Roteiro, não deixo de registar com especial carinho na minha memória o dia em que a presidência de um município contactou o CDN, indicando que tinha tomado conhecimento desta iniciativa da OA e demonstrado a sua total disponibilidade e interesse em colaborar na realização de um próximo Roteiro.

A conclusão e inauguração da nova Sede da OA/SRN foi outro momento muito marcante, que traduziu, de um modo exemplar, o trabalho continuado de muitas direcções, tanto do CDN como da OA/SRN, como dos autores do projecto.

A OA está hoje mais rica graças ao esforço realizado por todos. Foi uma obra com uma dimensão muito relevante, que possibilitou uma grande melhoria das condições de acolhimento e de recepção aos membros, da realização de acções e de eventos, bem como das condições de trabalho dos seus funcionários, comprovando também a capacidade de iniciativa e concretização da OA (CDN/SRN), bem como do seu contributo na reabilitação da cidade do Porto.

Do ponto de vista da intervenção ao nível internacional destaco dois momentos muito particulares. A candidatura e eleição, no decurso do mandato em causa, do vice-presidente, o arquitecto Pedro Ravara, para o Board do CAE, o que constituiu uma oportunidade de participação nesta organização a um outro nível de intervenção e de decisão.

A atribuição, em Novembro da 2016, da Medalha CSCAE (Consejo Superior de los Colegios de Arquitectos de España), pelo seu Presidente, o arquitecto Jordi Ludevid i Anglada, em reconhecimento das actividades desenvolvidas pelo Gabinete da Presidência do CDN, em nome da defesa das Políticas Públicas de Arquitectura. 

A medalha foi instituída no ano de 2010, com o objectivo de reconhecer arquitectos e entidades que tenham contribuído de forma significativa para a defesa dos interesses dos arquitectos e da arquitectura.

A cerimónia de atribuição teve lugar em Madrid, no Senado de Espanha, tendo proporcionado a oportunidade para, enquanto presidente do CDN, discursar perante a sua assembleia, os diversos convidados e as personalidades a quem foi igualmente atribuída a medalha em causa, constituindo um momento marcante, não só pelo modo como representou mais um passo na construção das relações entre as duas instituições, OA e CSCAE, mas também pela oportunidade de apresentar perante o Senado de Espanha as matérias de relevo pelas quais a OA se tinha vindo a debater e lutar ao longo do mandato, como seja o caso do Direito à Arquitectura e da elaboração de Projectos de Arquitectura exclusivamente por arquitectos.

 

Como vê, na actualidade, o papel desempenhado pela OA perante a sociedade e os arquitectos?

Encontramo-nos numa altura em que estão decorridos cerca de dois terços do presente mandato; creio que o momento ideal para um balanço do mesmo será no âmbito da realização das próximas eleições. Esse será o momento certo para o balanço do trabalho de todos.

Por outro lado, não posso colocar de lado o facto de ser membro eleito da Assembleia de Delegados, sendo esse o local ideal, por natureza, onde de momento devo e posso expressar a minha opinião sobre o papel presentemente desempenhado pela OA.

Posso, no entanto, nomear alguns aspectos que levo em consideração por serem reveladores do papel da OA, por exemplo a parceria desenvolvida com a TSF, algo de grande alcance enquanto modo de comunicar com a sociedade, incluídos os membros da OA, e o trabalho de comunicação com os membros que tem sido desenvolvido pela SRS à qual pertenço.

 

Quais serão os principais desafios da OA num futuro próximo?

Olhando para além do presente mandato, os temas da OA são recorrentes e carecem de constante atenção e empenho por parte do seus órgãos, em particular do CDN.

A questão da defesa da qualidade da arquitectura, tendo em conta a sua relevância para o bem-estar de todos os cidadãos, a questão de quem pode e quem deve elaborar projectos de arquitectura em Portugal, serão certamente matérias de grande relevo.

O relacionamento da OA com os seus membros e vice-versa é outro tema, sendo para tal fundamental continuar o trabalho de percepção da nova realidade que se vai desenhando num mundo onde muitas profissões estão em constante redefinição, à qual a arquitectura também não tem escapado se pensarmos como se têm alterado, tanto nos modos de produção como nos modos de relacionamento entre arquitectos e os diversos profissionais, como ainda na própria esfera de intervenção dos arquitectos. 

Num país que hoje se encontra quase exclusivamente alavancado e sustentado no investimento privado, ao contrário do que era a tradição num país marcado pelas realizações de carácter público, importa sem dúvida continuar a trabalhar com o Estado e a defender a implementação plena da Política Nacional de Arquitetura e Paisagem, o investimento público na modernização das suas instituições e na reabilitação dos seus equipamentos, bem como do seu património.

É igualmente essencial continuar a defender a implementação de novos referenciais, no que se refere aos honorários para a realização de projectos, associando este aspecto à concretização das portarias em falta no âmbito do CCP, como seja a relativa aos seguros profissionais.

A um outro nível, o reforço do relacionamento com outras instituições congéneres em Portugal e no estrangeiro será sempre um grande desafio. Portugal é um país localizado no limite oeste da Europa, essa posição de aparente fragilidade é, pelo contrário, também de força, tendo em conta o papel que a OA poderá desempenhar como mediador entre culturas próximas e distantes, sobretudo tendo em conta a qualidade da arquitectura portuguesa e o seu reconhecimento internacional. Será efectivamente muito importante a OA procurar assegurar outras responsabilidades a nível internacional, acreditando que as matérias em que a OA tem estado envolvida, muitas destas de caracter legislativo, poderão constituir temas de reflexão e interesse mais abrangente.

A internacionalização do trabalho dos arquitectos portugueses será sempre um urgente e importante desafio, tendo em conta a possibilidade de intervenção em novas áreas e territórios, tirando partido da sua capacidade de adaptação às diferentes culturas.

 

 


 

José Manuel Pedreirinho

Arquitecto, Presidente CDN

Tendo assumido em 2017 a presidência do CDN, num mandato com término em 2019, que momentos deste mandato considera terem sido marcantes relativamente ao papel da OA perante a arquitectura e o exercício da profissão?

Provavelmente o momento mais marcante do primeiro ano de mandato terá sido o retorno do J-A à sua publicação em papel.

Marcante por aquilo que significou de aposta num veículo essencial da comunicação com os membros, mas também por tudo aquilo que esse retorno indirectamente nos permitiu para a concretização de diversas outras iniciativas.

Neste mesmo campo, também o programa que ao longo do ano tivemos na TSF e que esperamos poder continuar. Este era um meio de comunicação para nós desconhecido, representou um momento marcante da nossa vontade de melhor comunicarmos com os nossos membros, mas sobretudo com todos aqueles para quem se dirige a nossa actividade. 

Temos também estado a acompanhar o desenvolvimento da Política Nacional de Arquitetura e Paisagem, preocupados que estamos com a expressão da dimensão política inerente à actividade do arquitecto. 

Tivemos outros momentos marcantes como o apoio generalizado que recebemos dos mais variados sectores aquando dos longos debates sobre os nossos direitos enquanto profissionais para exercermos em exclusivo a nossa profissão. 

Uma luta difícil e desigual, que apanhámos já a decorrer, que durante mais de um ano ocupou muito do nosso tempo e da nossa atenção. Uma luta que constava das primeiras reivindicações da formação da associação dos arquitectos, em 1902, e, desde então, sempre presente nos diversos mandatos. Uma luta que é bom termos presente que não é portuguesa mas antes bastante alargada, ainda que com nuances muito variadas de país para país. Um assunto que, naturalmente, continuamos a acompanhar de muito perto.

 

Quais as grandes dificuldades ou resistências com que a OA se tem deparado na actualidade para conseguir desempenhar o seu papel perante a sociedade e os arquitectos?

As dificuldades com que nos confrontamos não serão muito diferentes daquelas que muitos dos nossos membros nos transmitem face a uma estrutura legislativa cada vez mais complexa e exigente. Uma estrutura nacional e internacional com múltiplas e complexas interrelações entre ambas.

Difícil sobretudo pelas implicações e o envolvimento de inúmeros organismos num código da edificação, que há muito defendemos e parece finalmente estar a avançar, e numa uniformização de procedimentos que parece não interessar senão aos Arquitectos. 

Também a adaptação ao novo edifício legislativo imposto pelo novo estatuto que nos rege tem sido causador de constrangimentos e dificuldades e até de algumas naturais resistências internas.

Como todos sabem, continuamos legalmente impedidos de definir uma tabela de honorários, como nós próprios e os nossos membros desejariam. Um impedimento legal perante o qual estamos a tentar encontrar, também com os nossos colegas de outros países, soluções que até agora não foram possíveis de implementar. 

Alguns destes temas foram ainda recentemente debatidos num encontro em Viana do Castelo onde estiveram quase todos os eleitos dos diversos órgãos da OA e onde os presidentes da Mesa da Assembleia Geral, da Assembleia de Delegados, e eu próprio, reiterámos a nossa completa disponibilidade e compromisso em trabalharmos em conjunto para ultrapassarmos as resistências que vamos sentindo.

 

Quais serão os principais desafios da OA num futuro próximo?

Talvez que o maior desafio com que nos confrontamos hoje em dia tenha a ver com a necessidade de sabermos responder a mudanças que, por extremamente rápidas e muito complexas, exigem uma atenção e um tempo que nem sempre conseguimos ter. 

Mudanças de todo o tipo, algumas delas previsíveis, muitas outras completamente inesperadas.

Mudanças que são desafios à nossa capacidade de resposta perante factos tão diversos quanto a necessidade, bem real, de respondermos às inúmeras solicitações legislativas que Governo e Assembleia da República com cada vez mais frequência nos colocam ou de lançarmos algumas iniciativas que sabemos morosas, para uma estrutura interna de reduzida dimensão. 

Fomos também confrontados com a necessidade de responder à realidade criada pelo novo estatuto com um novo equilíbrio das responsabilidades dos diversos órgãos. Estamos ainda a ultimar o trabalho de alguns dos regulamentos necessários para a sua posterior apresentação à Assembleia de Delegados. 

Sabemos bem da necessidade de promovermos cada vez mais os direitos dos nossos membros e a excelência do seu trabalho. Um trabalho que continua a ser internacionalmente reconhecido mas nacionalmente ainda pouco valorizado. 

Só recentemente conseguimos desenvolver trabalho na área da internacionalização, onde esperamos em breve poder apresentar algumas propostas, e continuamos também a defender intransigentemente a realização de concursos como o mecanismo mais correcto para a encomenda pública.

Concursos onde a qualidade dos projectos e não o seu custo seja o factor determinante de escolha.

Como achamos que devemos, também neste aspecto, ter uma prática exemplar, concluídos que foram, recentemente, os procedimentos de legalização da nossa sede, estamos a ultimar as condições para o lançamento de um concurso para a ampliação das suas instalações.

Confrontados com a necessidade de promovermos uma maior cultura arquitectónica, iniciámos, com diversas associações de professores, um debate que agora vai continuar enquadrado num programa mais alargado com a Fundação Calouste Gulbenkian.

Outro desafio é a transição do período de formação para uma prática profissional, onde continuamos a assistir a um modo bastante disfuncional como muitos estágios estão a ser feitos.

Também as diversas Comissões Técnicas mereceram uma atenção no sentido de ser regularizado um funcionamento que estamos a acompanhar e deverá ser revisto no sentido da sua melhor operacionalização no apoio que devem dar ao funcionamento da OA.

Depois da necessária preparação prévia, vamos também relançar, tal como prometemos, o Prémio Nacional de Arquitectura. Um prémio que queremos adequado à nova realidade em que vivemos.

São como se vêem muitos os desafios que temos pela frente.